Em 'A Professora de Piano', filme de Michael Haneke, vemos em cena uma angustiada Isabelle Huppert merecidamente vencedora do prêmio de melhor atuação feminina em Cannes, contracenando com um jovem Benoît Magimel, num intenso, pesado e adulto filme de drama.
Com certeza, assisti-lo não é uma tarefa que agradará o grande público. Tampouco será plenamente alcançado em sua dureza e sofridão, e como o tempo nos mostrou, passou, injustamente, para o rol dos filmes ditos 'franceses' - no sentido pejorativo da palavra. Não é preciso muito para notar o quão maior essa obra se tornou, muito além da sua limitação de filme cult-aborrecido pela grande plateia, e sem sombra de dúvidas marcou não apenas a maior atuação até hoje da marcante e belíssima Isabelle, mas também mostrou-se exímio ao analisar as relações humanas mais complicadas e as inevitáveis e drásticas consequências do envolvimento sem consciência entre duas pessoas sem o completo conhecimento um do outro.
As aulas de piano ministradas por Erika (Isabelle) nos mostram bem o ambiente a que pertence. O instrumento em questão nos serve, aqui, como metáfora ao exprimir o conservadorismo de sua vida, as notas erradas duramente reprimidas nos lembram sua autorepressão em si, sua severidade para com os alunos, a severidade de sua própria mãe. O mundo externo em que vive é constantemente remetido a seu próprio universo interior, e vice-versa.
Pouquísismos filmes foram capazes de abordar a repressão sexual como esse o foi. Os olhares congelantes e distantes de Erika, em longos planos-sequência, nos transportam para a realidade doentia de sua vida. Ela, uma mulher que não conseguiu crescer e criar sua própria vida, compartilhando de intimidades e detalhes com a mãe, dando sempre satisfações de sua rotina, envolve-se com um jovem estudante de piano, que mostra-se claramente interessado por ela desde seu primeiro encontro. É claro que Erika não conseguirá libertar-se de suas próprias correntes e entregar-se a um relacionamento maduro. Ela está por volta de seus 40 anos, acostumada a uma castidade pouco comum em nossa sociedade.
Há trechos memoráveis no filme, que certamente deve ser visto. Inesquecível, nos dá um belíssimo exemplar do cinema francês, em sua mais pura essência e originalidade na abordagem de personagens, e Haneke nos agracia com um dos melhores filmes dessa virada de século.
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