sexta-feira, 15 de agosto de 2008

David Lynch


Ontem fui reassitir Inland Empire, já que por algum motivo o Espaço de Cinema resolveu reexibir o filme, que entrou em circuito em dezembro do ano passado. Acredito que a volta dele tenha sido pelo fato do diretor David Lynch ter estado semana passada em São Paulo, pela primeira vez, no intuito de divulgar seu primeiro livro e também um projeto pessoal muito interessante que já foi colocado em prática em algumas escolas dos EUA, que consiste em integrar aos sistemas de aula exercícios de meditação transcendental, que segundo ele e estudos comprovados, ajudam no fortalecimento do raciocínio e na diminuição significativa da violência.

Águas Profundas não é um livro de pretensão literária que muito dos diretores resolvem lançar quando já fizeram de tudo. Trata-se de um pequeno manual de esclarecimento, no qual conta como, quando e onde teve inspiração para utilizar recursos unicamente inovadores no cinema.

Lynch é conhecido no cenário alternativo por delírios visuais indescritíveis. Sua versatilide como diretor, roteirista, músico e artista plástico mostrou-se tão surpreendente quanto improvável ao longo das décadas, desde que seu primeiro filme de sucesso foi o tristíssimo O Homem-Elefante, que conta a história verídica de John Merrick, que devido à Síndrome de Proteus, nasceu com o corpo todo deformado e virou uma atração circense. Quando encontra um médico compreensivo e solidário (interpretado magistralmente por um relativamente novo Anthony Hopkins), têm a sua primeira chance na vida de ser tratado como um ser-humano digno.
Adquiriu notoriedade convicta quando lançou na década de 90 a série Twin Peaks - Os Últimos Dias de Laura Palmer, que contava a história de uma mulher assassinada (A Laura do título) e as investigações de um detetive até chegar à solução do caso. Um enredo desses que parece normal e sem atrativos, torna-se viciante quando misturado com elementos presentes na filmografia de Lynch. Por exemplo, o detetive (interpretado por Kylan MacLaughlan) tem de tomar chá com a Senhora do Tronco para obter informações sobre o assassino, e tem insights reveladores durante seus sonhos, onde, por exemplo, uma prima de Laura Palmer idêntica à mesma está sentada num quarto vermelho, vestindo vermelho, numa poltrona vermelha, falando coisas desconexas, ouvindo jazz e observando um anão à sua frente a dançar. Essa cena é um dos marcos de David Lynch, e em seu livro ele explica de onde veio a inspiração.


No entanto, o forte de Lynch sempre foi criar tramas surreais, oníricas e extremamente complexas e difíceis. A exemplo disso, pode-se citar A Estrada Perdida, Cidade dos Sonhos e o mais recente Império dos Sonhos. Como obviamente dá para reparar, o plano do subconsciente é o que predomina em suas obras, onde muitas vezes não há a distinção óbvia do passado, presente e futuro.

Para abordar os temas de forma mais obejtiva, vou destribuí-los em tópicos, que aqui seguem:

-Compreensão das obras: há muitos fãs que declaram entender tudo dos longas de Lynch. A pergunta que deve persistir: mas poxa, é tão difícil entender seus filmes assim? Sim, acredite. Mas o grande problema está na maneira como as pessoas querem chegar à compreensão: acostumados com o processo racional de entendimento, elas esquecem de seguir as partes mais sensíveis da mente. O abstrato de seus filmes, a loucura, não podem ser apreciadas se você estiver preparado para assitir um enredo provável e lúcido. É a mesma coisa que tentar compreender uma pessoa louca: dá para fazer isso, sendo são? Óbvio que não. Por isso, se a pessoa tem vontade de se aventurar por um lado diferente do sensorial, é preciso viajar, literalmente. E valham-se interpretações. O mais importante é deixar-se levar: sensibiliar-se, sentir, se emocionar, se comover.


O grande problema - e é isso que limita a platéia que gosta de seus filmes - é que todos estão acostumados àquela fórmula perfeita de se fazer cinema. Princípio, meio e fim. Felicidade, melancolia, clímax, desfecho otimista. Duração curta. Trilha sonora beem de acordo com os momentos de tensão. E é aí que está todo o encanto e genialidade do cinema de Lynch; fugindo do óbvio, cria tramas de suspense que até o último instante, vão de acordo com o que estamos acostumados a ver; mas aí no clímax, o enredo enreda-se por caminhos obscuros da mente, imagens assustadoras.
Lynch brinca com o telespectador. Brinca, mas não zomba. (Aliás, foi até engraçado: quando fui no cinema ano passado para asssitir Império dos Sonhos, em um determinado momento a protagonista fala: I don't know what I'm doing here. E uma senhora atrás de mim comenta: NEM EU!)
Mas essa confusão é básica.

Motivos para tanta decepção: Cinema é feito para se divertir. Sim, concordo, mas não somente. Filmes-denúncia, políticos, reveladores, sociais e culturais são essenciais para refletir a sociedade. Entendo que hoje em dia, principalmente, cerca de 80% do povo procura assitir um filme para relaxar, esquecer os problemas, aliviar as tensões. Ou como fundo de tela para um belo beijo (digno de cinema). Por isso, é até compreensivo que as pessoas saiam no meio da projeção quando se deparam com um filme mais arrastado e surreal, porque definitivamente têm mais o que fazer do que assitir as loucuras de um diretor. Mas não adianta convencer alguém de que um filme que ela não gosta é bom, é questão de ver e gostar e acabou. Portanto, os motivos de tantos odiarem seus filmes já tá mais do que explicado - muita gente não gosta de assistir um filme sem pé nem cabeça.

Para os que gostam: Para os fãs, como eu, Lynch é único por inserir em seus filmes pessoais elementos inimagináveis. Ontem, pela primeira vez, das três que vi Inland Empire, senti um medo terrível. Por muitas vezes, seus enquadramentos nos fazem sentir-nos como num sonho "de verdade". Além disso, a cada vez que assisto, percebo um detalhe, uma minúcia, e que se encaixada com determinada cena, fazem mudar toda a interpretação do filme. Literalmente, a cada vez que são vistos, seus filmes são mais complicados. E mais fáceis, ao mesmo tempo. Além disso, um ponto a seu favor é a versatilidade.

Os problemas: Laura Dern quando interpretou Nikki Grace/Susan em Inland Empire, afirmou ter interpretado na verdade três personagens. Lynch afirmou terem sido quatro. Mas dependendo de que aspecto psicológico e de personalidade você abordar, podem variar até cinco. Inland pode ter sido o último filme a concluir a trilogia sobre Hollywood, começada com Estrada Perdida. Em todas, há a decadência de atrizes que acabam envolvendo-se de uma forma destrutiva com personagens ou filmes. É duplamente metalingüístico: é um filme-dentro-de-um filme, e autoexplicativo (cabe a alguém desvendá-lo).
Esse último é o mais surreal de todos. Das três horas de duração, duas são destinadas à jornada da personagem do filme (dos dois filmes) e seus devaneios. É simplesmente genial.


Se alguém por acaso se interessar e sem no entanto nunca ter visto algo dele, recomendo começar por Cidade dos Sonhos(Mulholland Dr.) , meu favorito. Depois, aconselho O Homem Elefante - e sugiro a comparação entre eles. Depois, caso tenha despertado verdadeiro gosto, aventurem-se pelos demais, desde Eraserhead - seu primeiro, e o mais absurdo - até Inland Empire, se tiverem disposição para perder três horas sabendo que muito provavelmente, de duas uma: ou não entenderá porra nenhuma (que é exatamente com essa cara que todo mundo sai do cinema) ou terá uma interpretação completamente diferente da de todo mundo. Genial, não?

sexta-feira, 8 de agosto de 2008

Nesses dois dias, vi filmes bem diferentes entre si quanto ao gênero, ano de produção e intuito. Foram eles O Mágico de Oz (acho que não tive infância, só vi esse filme recentemente...), O Anjo Exterminador e Batman (O Cavaleiro das Trevas).



The Wizard of Oz sempre foi a história infantil com a qual mais me identifiquei, passando longe de contos como Pinóquio (ainda que meu respeito seja grande), ou A Bela Adormecida. Bom, como nem todos sabem, vale lembrar que todas essas animações musicais que vimos quando crianças não são da Disney, e sim fábulas antigas ou clássicos literários, caso de Alice no País das Maravilhas ou A Bela e a Fera. Quase todos eles têm um significado, seja apenas uma advertência ou o que posteriormente seria motivo de teses e mais teses psicanalíticas que gerariam grandes Complexos (como o de Peter Pan).


O Mágico de Oz e A Bela e a Fera são as fábulas que mais gosto, as que mais me identifico e acho intrigantes. O fato de adorar Judy Garland e ser um clássico do Cinema, foram os fatores que me fizeram ver logo o primeiro. Uma adaptação belíssima do segundo foi feita em 1933 por Jean Cocteau, onde os elementos principais da história foram abordados.


Vendo Oz, notamos logo porquê o filme tornou-se imortal. É maravilhoso em músicas, cores, ênfases e atuações. E até em efeitos especiais (já imaginaram o que era fazer uma casa voar num tornado em 1939?). Foi considerado o melhor filme familiar de todos os tempos, e sua mensagem é bem mais sutil do que parece: às vezes, o que procuramos está mais perto do que imaginávamos, e só precisamos de situações desafiadoras que nos mostrem isso.


O Anjo Exterminador é um filme do aclamado diretor Buñuel, considerada sua obra-prima surrealista. Três diretores são mestres em fazer filmes adultos e difícies: Bertolucci (já mencionado), Pasolini e Buñuel.

Esse não é uma exceção, pertencendo a quem pertence.

Na história, um luxuoso jantar é oferecido na casa de um rico casal, que convida vários amigos (igualmente da alta sociedade) após uma ópera. Inexplicavelmente, os convidados não conseguem sair da mansão, e a decadência e as farsantes começam a prevaleçer. E valham-se interpretações ao filme.

Claramente, o obra não tenta focar no fato de por que as pessoas não conseguem sair da casa - e se alguém vir o filme, perceberá que sequer tentaram - mas sim em como as pessoas são no seu íntimo. A projeção fez-me lembrar da tristeza de Ensaio Sobre a Cegueira - que dadas as devidas proporções, tem lá suas semelhanças. É um clássico do cinema europeu que inspirou muito - inclusive o Big Brother - e que tem suas divergências no público.



E Batman é simplesmente maravilhoso. Definitivamente, Heath Ledger arrasou como o Coringa, Christian Bale fez jus ao papel, Aaron Eckhart também, e Maggie Gylenhaal igualmente. Efeitos especiais m-a-r-a-v-i-l-h-o-s-o-s, enredo original e trama muito bem bolada. Um arraso de filme, justifica toda a publicidade em torno dele. é FOODA!

terça-feira, 5 de agosto de 2008

Bertolucci


Bertolucci é um consagrado diretor, conhecido principalmente pelo (super) polêmico O Último Tango em Paris, que traz a cena clássica conhecida vulgarmente como "da manteiga". Feito numa época de prolífera descoberta artística do cinema e ainda remanscente do auge da revolução sexual da década de 60 (o filme é de 70, O ano dos grandes filmes), a obra representou exatamente aquilo que Bernardo sempre retratou nos seus filmes, mais enfaticamente ou não: a solidão, o medo, a depressão, a melancolia, e o sexo como síntese de várias emoções.

Recentemente revi seu filme mais recente, Os Sonhadores. Há algum tempo, quando o vi pela primeira vez, simplesmente não gostei. Caí naquela que pode ser a justificativa mais óbvia da platéia que não gosta de seus filmes: contém "apelação" demais. Mas agora vejo como é uma obra-de-arte.


No entanto, o que mais fica claro - e o triste de toda a reflexão - é ver como a sociedade não mudou muito perante o sexo. Ainda que vivamos uma nova revolução (também não é preciso ir longe para observar), a mentalidade da grande maioria continua muito "casta" e conservadora. O difamado Último Tango de uma longínqua década de 70 chocaria igualmente hoje em dia (há quem duvide, diga que hoje até as novelas mostrem mais, mas não da maneira crua e nua do cinema, principalmente europeu), assim como Os Sonhadores chocou.


O cinema de Bernardo Bertolucci não é para qualquer um (não me excluo totalmente disso, nem eu ainda tenho a maturidade para entender certos aspectos de suas obras). Suas personagens são sempre e invariavelmente complexas emocional, psicológica e sentimentalmente. Postas em situações de extremo teor, são obrigadas a tomar atitudes precipitadas, desesperadas. Em muitos casos, essas situações complicadas são transpostas metaforicamente em ato sexual, por isso as muitas conclusões de que o filme torna-se "apelativo".


Mas não seguindo essa linha adulta demais, ele também conseguiu fazer obras belíssimas e inesquecíveis, como Beleza Roubada (que traz uma Liv Tyler espetacularmente linda e encantadora) e O Último Imperador. No início de sua carreira, fez filmes políticos. É um diretor polêmico, sempre, mas adulto, maduro, que sabe como ninguém retratar as mais angustiadas das figuras humanas. Vale à pena uma dedicação especial e um tempo reservado a seus filmes.